Saúde revoga portaria que garantia, sem perícia, estabilidade a quem contraiu covid-19 no serviço
Por Aldemir Pereira Nogueira, coordenador da área Cível, Relações de Trabalho e Consumo | Publicado no Jornal Estado de São Paulo em 09/09/2020
BRASÍLIA – O Ministério da Saúde anulou nesta quarta-feira, 2, uma portaria, que havia sido publicada no dia anterior, e incluía a covid-19 na Lista de Doenças Relacionada ao Trabalho (LDRT). Essa mudança poderia garantir, sem perícia, estabilidade de um ano no emprego ao trabalhador, caso ele contraísse covid-19 no serviço.
A medida estava em uma portaria publicada na terça-feira, 1º, que foi invalidada por outra portaria, publicada nesta quarta, 2, em edição extra do Diário Oficial da União.
Na portaria de terça-feira, a covid-19 aparecia classificada como pertencente ao grupo “Doenças Relacionadas ao Trabalho com respectivos Agentes e/ou Fatores de Risco”, devido à possível exposição ao vírus em atividades de trabalho.
Ministério da Saúde
Com a revogação do Ministério da Saúde, volta a valer o entendimento do STF sobre a covid-19 contraída no trabalho. Foto: Jefferson Rudy/Agencia Senado
Com essa classificação, a medida permitiria que funcionários afastados por mais de 15 dias passassem a receber auxílio-doença acidentário, além de estabilidade por um ano e direito ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Se a portaria estivesse em vigor, ao pedir afastamento ao INSS, o médico poderia considerar que se tratava de doença do trabalho, sem necessidade de prova. E caberia, então, à empresa provar o contrário.
Coordenador da área de Relações de Trabalho e Consumo do escritório Andrade Silva Advogados, Aldemir Pereira afirma que, após o recuo do ministério, o trabalhador deve comprovar, por meio de perícia, que a infecção pela covid-19 teve relação com o local de trabalho para receber benefícios como a estabilidade.
Antes, diz ele, “se o empregado faz home office, poderia ser considerado também doença ocupacional”. “Caberia à empresa comprovar que não, que ele está em confinamento, em home office.”
Com o recuo, volta a valer o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril, a Corte já havia definido que os casos de contaminação de trabalhadores pelo coronavírus poderiam ser enquadrados como doença ocupacional. No entanto, esse reconhecimento não é automático. O funcionário precisa passar por perícia no INSS e comprovar que contraiu a doença no trabalho.
Doença ocupacional é aquela adquirida ou desencadeada em função da realização de atividades cotidianas no trabalho. Entre as mais comuns, por exemplo, estão a Lesão Por Esforço Repetitivo (LER), lombalgias, hérnias, doenças de audição e visão e até psiquiátricas, como depressão e ansiedade.
Quando um empregado é afastado por doença ocupacional, ele recebe um auxílio-doença acidentário e a empresa é obrigada a pagar o FGTS do período de afastamento, além de ter que dar estabilidade de 12 meses após a alta do INSS.
Para que uma doença seja considerada ocupacional, é necessário que ela seja adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, isto é, que haja um nexo causal entre a doença e o trabalho.
A equipe Cível, Relações de Trabalho e Consumo coloca-se à disposição para qualquer esclarecimento sobre este tema.