Tokenização de imóveis como forma de pagamento da dívida ativa: entenda!

Por Samuel Pouzas de Andrade Silva, coordenador da área Societária, Mercado de Capitais e M&A na Andrade Silva Advogados, e Isadora Miranda, coordenadora do Contencioso Tributário na Andrade Silva Advogados


Questão sensível no Brasil, a dívida ativa dos brasileiros e empresas instaladas no país superou R$ 4 trilhões de reais.  São mais de sete milhões de contribuintes com débitos inscritos na dívida ativa, entre pessoas físicas e jurídicas. Muitos embaraços permeiam a cobrança da dívida, e as principais a serem consideradas são: (i) perfil da dívida – sendo 44% dos créditos irrecuperáveis; (ii) dívida inscrita há mais de 15 anos e (iii) judiciário inflado, sem conseguir dar a vazão necessária às discussões judiciais que envolvem os tributos exigidos.

Uma vez inscrito em dívida ativa, o contribuinte tem algumas possibilidades para extinguir aquele débito tributário: parcelamento, pagamento e até mesmo a dação em pagamento. A última opção, menos conhecida pela população, e prevista no Código Tributário Nacional no artigo 156, inciso XI, ganha novos traços a partir da evolução tecnológica e ampliação de atuação das novas frentes, como o blockchain.

É certo que a dação em pagamento é uma alternativa de quitação do crédito tributário mais burocrática, uma vez que a administração pública renuncia ao recebimento do montante em dinheiro, para auferir o valor dos débitos em imóveis. Assim, essa operação merece a devida regulamentação, em prol da preservação do patrimônio público e do bem comum.

Entretanto, a dação possui alguns entraves, principalmente pela natureza da operação. Não raro, o contribuinte estava disposto a dar um imóvel em pagamento de uma dívida, mas a avaliação do bem superava o valor devido, o que gerava um desconforto e desestímulo, dado que a administração pública não pode retornar ao contribuinte a diferença do valor pago e valor devido.

Além disso, alguns operadores do direito caracterizam a operação como uma apropriação indébita, justamente pelo fato de que o Estado poderia receber valor superior ao que lhe é de direito, gerando uma insegurança ainda maior para os contribuintes.

Com o avançar do desenvolvimento, tecnologias como o blockchain surgem para facilitar o uso de imóveis para a quitação de dívidas e aumentar a eficácia da dação em pagamento. Nesse cenário, emerge a tokenização como ferramenta capaz de solucionar tal impasse.

A tokenização se caracteriza pelo “fracionamento” do imóvel em pequenas propriedades para sua posterior venda digital, por meio de tecnologias como blockchain e smart contracts. Isso proporciona maior liquidez dos imóveis e aumenta a possibilidade de convertê-los em dinheiro para a administração pública. Este processo aumenta a liquidez dos bens, garante a segurança na automatização de contratos e na gestão da propriedade, e dá agilidade e transparência às transações.

Do ponto de vista prático, a tokenização de imóveis facilita a liquidação de débitos. Entretanto, a dação em pagamento continua dependendo de aprovação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – PGFN, conforme preceitua a Lei nº 13.259/2016.

A Lei destaca que a possibilidade da dação fica “ao critério do credor”. Além disso, para ser concretizada a operação, deve ser precedida de avaliação do bem, que deve estar livre e desembaraçado de qualquer ônus e deve abranger a totalidade do crédito que se pretende liquidar, sem descontos.

Ademais, a temática ainda esbarra em algumas barreiras pela falta de uma regulamentação clara sobre a matéria. Por exemplo: em relação ao direito real de propriedade, quem, dos diversos donos dos tokens de um determinado imóvel seria o administrador do bem?

Além disso, como fica a interlocução entre devedor, PGFN, arrematante e cartório?

De partida, a validade dos negócios jurídicos relacionados a imóveis acima de 30 salários-mínimos depende de escritura pública. Por isso, saídas tecnológicas como a tokenização enfrentam ainda uma zona cinzenta legal.

Por fim, ainda, se a fração do imóvel (token) for entendida como um valor mobiliário, esta deve ser regulamentada pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM.

Ficou alguma dúvida? Conte com as equipes Societária e Tributária da Andrade Silva Advogados.


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