Da necessária estruturação de um programa de integridade pelas empresas que contratam com o poder público

Por Ana Flávia Patrus, especialista da área Infraestrutura e Contratos Púbicos na Andrade Silva Advogados.


Há quase 10 anos, em um cenário de denúncias de corrupção, ineficiência dos serviços públicos e de déficit fiscal (ainda presentes no país), o combate à corrupção, ainda que de forma tardia, assumiu um papel de relevo na agenda política e econômica brasileira, resultando na publicação da Lei Federal 12.846/2013. A citada lei dispôs sobre a responsabilização administrativa e civil das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. 

A referida legislação elencou os atos considerados ilícitos, as penalidades aplicáveis e disciplinou o processo administrativo para responsabilização das empresas envolvidas em atos de corrupção. No âmbito federal, até aquele momento, a responsabilização administrativa, civil e penal, por atos ilícitos praticados contra a administração pública era disciplinada pelas Leis de Ação Popular n. 4.717/1965, Ação Civil Pública n. 7.347/1985, Improbidade Administrativa n. 8.429/1992, Licitações e Contratos n.8666/93 e pelo Código Civil.  

Embora nas leis citadas exista a possibilidade de penalização de pessoas físicas e jurídicas de direito privado por atos ilícitos contra a administração pública, foi a partir do advento da Lei Anticorrupção que as empresas passaram a ser o foco de responsabilização, havendo inclusive a previsão de medidas drásticas tais como a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica – que permite o direcionamento das demandas às pessoas físicas dos sócios – e a aplicação de multas estratosféricas, capazes, dependendo do contexto, de inviabilizar a continuidade da própria atividade empresarial.   

Segundo a Lei Anticorrupção, a existência de procedimentos internos de integridade, auditoria, incentivo à denúncia e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito das empresas que têm contrato com o poder público, é um dos parâmetros considerados na aplicação das sanções. 

Regulamentando a referida legislação, o Decreto Federal 8.420/2015 corroborou a existência de programa de integridade como critério a ser considerado na dosimetria da pena estipulando, inclusive, percentual de redução de multa, caso a empresa tenha um programa de integridade implementado. 

Na esteira da legislação federal, diversos estados e municípios também editaram leis e atos administrativos, tendo por objetivo o combate à corrupção.1 

A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal n. 14.133/2021) previu uma série de situações que, direta ou indiretamente, impuseram às empresas que se relacionam com o poder público a necessidade de implementação de um programa de integridade. 

De fato, a partir de diversas investigações, com destaque para o Mensalão e a para a Operação Lava Jato, a corrupção deixou de ser tratada apenas nas rodas de políticos e de juristas, para ser objeto de discussões nas redes sociais, conversas em família, com os amigos, em casa ou no bar.  

Nesse cenário houve um incremento da atuação dos órgãos de controle – Ministério Público, Tribunais de Contas, Controladorias e sociedade – que passaram a fiscalizar, com maior rigor, os casos nos quais a temática da corrupção estava envolvida. 

O problema é que, em muitos casos, observa-se que, de legítimas preocupações com a defesa do patrimônio público, a fiscalização exercida pelos órgãos de controle tem se desvirtuado em mera sanha persecutória, havendo uma tendência de considerar de forma mais abrangente os atos tipificados como corrupção, em patente violação ao direito dos administrados. 

Ademais, ao julgar casos envolvendo corrupção, os tribunais têm desconsiderado o aspecto subjetivo da conduta, penalizando, indistintamente, empresas idôneas e inidôneas, inclusive com a atribuição de sanções desproporcionais. 

Diante disso, para além de cumprir a lei, as empresas que se relacionam com o poder público precisam comprovar que reconhecem e que tratam os riscos de corrupção, demonstrando, inclusive, o comprometimento da alta administração com práticas anticorrupção.  

O instrumento legalmente previsto para demonstrar o comprometimento de uma corporação com o combate à corrupção é o programa de integridade que deverá conter mecanismos eficientes, capazes de minimizar, tratar e de endereçar os riscos de corrupção no âmbito das organizações.  

Além de obrigatório àquelas empresas que desejem realizar contratações de grande vulto com o poder público, nas situações de empate, entre duas ou mais propostas, no âmbito do processo licitatório, o programa de integridade atua como um critério de escolha, beneficiando a corporação que comprovar que detém um Programa ativo e efetivo.  

Outro benefício da implantação do programa de integridade é a possibilidade de reduzir penalidades sofridas no transcurso da execução de um contrato público. 

Indiscutivelmente, a conduta íntegra, além de configurar requisito indispensável a quem contrata ou pretende contratar com o poder público, apresenta-se de extrema relevância na medida em que tangibiliza lucro e resultados para as corporações.

Ficou alguma dúvida? Fale com a equipe da área de Infraestrutura e Contratos Públicos da Andrade Silva Advogados.


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