A Expansão do Mercado de Capitais e a Tecnologia Cripto

Por Marcos Camilo, especialista da área Societária, Mercado de Capitais e M&A na Andrade Silva Advogados


O Mercado de Capitais brasileiro está em franca expansão. Nos últimos 3 anos a entrada de pessoas físicas na bolsa de valores ocorreu em ritmo forte: somente em 2021, 1,5 milhão de pessoas entraram no sistema de investimentos da B3 (Bolsa de Valores Brasileira) investindo em renda variável. Em 2019, esse número era inferior a 900 mil investidores.

De acordo com a AMBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), mais de 60% têm idade inferior a 40 anos. A maioria ainda é masculina.

Em 2021, 45 empresas fizeram sua abertura de capital na bolsa de valores – processo chamado de IPO (em inglês: Initial Public Offering). Um aumento expressivo de aproximadamente 10% de empresas listadas no mercado público de capitais.

As empresas ofertam seus títulos jurídicos financeiros na bolsa de valores com o intuito de atrair capital para o desenvolvimento de projetos de expansão empresarial. O mercado de capitais viabiliza ao empresário pode captar investimentos, por meio de títulos de dívida ou de sociedade, para viabilizar a implementação de uma nova planta industrial ou um plano de expansão internacional, por exemplo.

Ou seja, as empresas e empresários captam empréstimo ou novos sócios no mercado, na bolsa de valores, corretoras, bancos de investimento. A vantagem para a empresa é reunir o capital necessário para implementar novos projetos. Para o investidor a vantagem é remunerar melhor o seu capital, seja pelos juros dos títulos de dívida, seja pelos dividendos distribuídos pela empresa e também pela valorização do título com o tempo.

Nessa onda de boas notícias, em ritmo também muito acelerado, vem crescendo a oferta de tecnologia e novos métodos para o desenvolvimento da oferta de capitais ao mercado empreendedor.

Segundo a Receita Federal, no Brasil, já são mais de 1,5 milhões de pessoas declarando investimento em criptoativos. A AMBIMA informa um número de 4,2 milhões de pessoas.

Em 2016 foi regulado pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) a possibilidade de captação de investimentos por pequenas e médias empresas. Em 2022 a regulamentação foi renovada ampliando o valor que pode ser captado nessa modalidade e criando mais facilidades para que as empresas ofertem seus projetos para investimento no mercado público.

Muito recentemente, também, tem se noticiado que a B3 possui projetos experimentais de transação de títulos tokenizados de empresas médias. Ou seja, empresas que ainda não atingiram um tamanho que viabilizaria um IPO e abertura de mercado na B3, mas que já possuem estrutura para iniciar a jornada utilizando plataformas especiais.

E, nesta mesma toada, recentemente a CVM publicou um parecer técnico sobre a tokenização de títulos ofertados no mercado público, ou seja, a utilização da tecnologia blockchain para agilizar as negociações e transações dos títulos. A mesma tecnologia basilar da ferramenta PIX de transferências bancárias, utilizadas no Brasil e copiadas por vários sistemas financeiros de outros países, de primeiro mundo, inclusive. Neste parecer, a CVM também trouxe algumas análises importantes sobre a negociação de criptoativos (criptomoedas, tokens etc.) e títulos vinculados a criptoativos (NFTs, derivativos etc.).

De início a CVM alerta pela inexistência de regulação sobre os criptoativos e destaca que a OCDE já se posicionou sobre a urgência do tema. Também conceitua os criptoativos como valores mobiliários e, portanto, sujeitos à regulação caso ofertados abertamente ao público.

Deixa claro que o token em si não é valor mobiliário objeto de fiscalização da CVM, mas a sua distribuição pública, sim. Ou seja, tanto a oferta de títulos tokenizados como a utilização da tecnologia de criptografia para a distribuição e negociação devem ser objetos de regulamentação e fiscalização da CVM. Também já deixa claro que derivativos de tokens são valores mobiliários.

Na sequência, alerta para a zona cinzenta da oferta pública, dado que os tokens são transacionados basicamente pela internet e, portanto, sem limitação geográfica e de acesso público. E que, para o aspecto da publicidade da oferta, o ofertante deve agir para limitar o acesso de pessoas à oferta, caso não pretenda cumprir com todas as exigências regulatórias de uma oferta pública.

Ato continuo a CVM classificou os ativos tokenizados:

a. Token de Pagamento (cryptocurrency ou payment token): busca replicar as funções de moeda, notadamente de unidade de conta, meio de troca e reserva de valor;

b. Token de Utilidade (utility token): utilizado para adquirir ou acessar determinados produtos ou serviços; e de Pagamento;

c. Token referenciado a Ativo (asset-backed token): representa um ou mais ativos, tangíveis ou intangíveis. São exemplos os “security tokens”, as stablecoins, os non-fungible tokens (NFTs) e os demais ativos objeto de operações de “tokenização”.

É interessante a abordagem da CVM sobre a possibilidade de tokenizar vários tipos de direitos: direito de voto de uma ação ou título societário, direito de recebimento de dividendos, e outros. Ou seja, com o desenvolvimento da tecnologia, somos capazes de fragmentar direitos e interesses e automatizar a execução destes direitos, inclusive dentro dos sistemas de investimento empresarial no mercado de capitais.

Sobre o conceito de contrato de coletivo de investimento, traz os critérios para avaliação se um token é valor mobiliário. Vejamos:

i. Investimento: aporte em dinheiro ou bem suscetível de avaliação econômica;

ii. Formalização: título ou contrato que resulta da relação entre investidor e ofertante, independentemente de sua natureza jurídica ou forma específica;

iii. Caráter coletivo do investimento;

iv. Expectativa de benefício econômico: seja por direito a alguma forma de participação, parceria ou remuneração, decorrente do sucesso da atividade referida no item (v) a seguir;

v. Esforço de empreendedor ou de terceiros: benefício econômico resulta da atuação preponderante de terceiro que não o investidor; e

 vi. Oferta pública: esforço de captação de recursos junto à poupança popular.

Sobre as análises técnicas de oferta pública e valores mobiliários, a CVM reforça que títulos estrangeiros ofertados no Brasil estão sujeitos à sua fiscalização e compliance. Reforça também que o seu objetivo central é promover a transparência (princípio do full and fair disclosure) sobre o mercado de investimentos, não cabendo a ela a análise de mérito dos investimentos ofertados.

A CVM determina também que as transações secundárias de critpoativos e derivativos deve ocorrer em balcão organizado, nos termos da legislação aplicável.

Destaca que toda a legislação de mercado de capitais é aplicável, sobretudo quanto aos deveres de depósito, liquidação e escrituração dos títulos.

Sobre os emissores ofertantes, a CVM destaca a necessidade de identificação das suas atividades, projetos, informações básicas do negócio, partes relacionadas e participantes da oferta, fatos relevantes, informações financeiras etc. Ou seja, todos os elementos necessários para avaliação e balizamento da expectativa de retorno econômico com o investimento.

Aos investidores, devem estar claros os direitos conferidos. Expectativa por valorização em mercado secundário, riscos do negócio, dividendos, juros, amortizações, resgates, votos, vetos, taxas, despesas, direito de posse da chave do token (quem controla a chave – o proprietário ou prestador de serviço terceirizado) etc.

Além dos direitos básicos de investidor, também devem ser garantidos os direitos de usuário de plataformas digitais, como por exemplo, o SLA que determina níveis e prazos de suporte técnico aplicáveis ao usuário de softwares necessários para a realização das transações.

A CVM já se manifestou sobre a possibilidade e os termos para investimento direto em criptoativos por fundos de investimento constituídos no Brasil. Sobre este tema, a CVM não inova no parecer técnico.

Sobre a tributação, não é matéria da CVM, já tendo se pronunciado a Receita Federal na IN RB 1.888/2019.

Aconteceu no dia 09/11, quarta-feira, o webinar Criptoativos e Mercado De Capitais - Saiba como usar a tecnologia para negociar os ativos da sua empresa.

Confira na íntegra o evento e compartilhe com outros empresários, CEOs, especialistas em blockchain ou consultores em fundo de investimentos: https://www.youtube.com/watch?v=MQU_Pc7Fwuo&t=2s

Ficou alguma dúvida? Conte com a equipe da área Societária, Mercado de Capitais e M&A da Andrade Silva Advogados.


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