David Andrade e Samuel Pouzas escrevem para o Jornal Jurid sobre “O imposto sobre transmissão causa mortis e doações – ITCD e sua decadência”

Por David Gonçalves de Andrade Silva, fundador da Andrade Silva Advogados, e Samuel Pouzas de Andrade Silva, coordenador da área Societária, Mercado de Capitais e M&A da Andrade Silva Advogados | Publicada no Jornal Jurid em 16.04.2024


De competência estadual, o ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações, atualmente tem sua alíquota máxima fixada em 8%, conforme art. 155, inciso I da Constituição Federal e Resolução nº 9 do Senado Federal. Dessa forma, os Estados podem definir as alíquotas do citado imposto, desde que limitadamente ao citado teto. 

A reforma tributária, já aprovada, constitucionalizou a progressividade do ITCMD. Todavia, o apetite fiscal não irá parar por aí. Tramitam no Congresso Nacional diversas propostas de aumento da alíquota máxima do ITCMD, como se pode ver, como exemplo, do Projeto de Resolução nº 57 do Senado Federal, que se aprovado elevará o teto de 8% para 16%. 

A possibilidade de se pagar um tributo com uma alíquota fixa ainda limitada a 8% (Minas Gerais, por exemplo, tributa em 5%), frente a uma progressividade já estabelecida pela reforma tributária e propostas que mais que dobram a atual alíquota máxima, motivam empresários e contribuintes a anteciparem os efeitos naturais da sucessão, por meio dos instrumentos de doação. 

Neste cenário, importantíssima é a análise do fenômeno da decadência tributária, em face do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações – ITCMD.

Como se sabe o ato administrativo de lançamento tributário encontra-se sujeito ao prazo decadencial de cinco anos, que não se interrompe por circunstância alguma e que flui a partir do primeiro dia do exercício seguinte ao que poderia ter se efetivado (art. 173, I do Código Tributário Nacional), ou, nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, da data da ocorrência do fato gerador (§ 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional). 

O fato gerador do ITCMD ocorre no momento da tradição, da entrega do bem doado ou quando transmitido por sucessão. 

Nesta senda, a constituição do ITCMD, ainda que proveniente de doação ou sucessão não declarada à SEF, deverá respeitar o prazo decadencial disposto no inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional, isto é, a Fazenda Estadual poderá constituir o crédito tributário em até 5 (cinco) anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. 

Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial 1.841.798-MG, da Relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, sob o regime dos recursos com efeito repetitivo (artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015).

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 1048. DECADÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO. CONTROVÉRSIA SOBRE O MARCO INICIAL A SER CONSIDERADO. FATO GERADOR. TRANSMISSÃO DE BENS OU DIREITOS MEDIANTE DOAÇÃO. CONTAGEM DA DECADÊNCIA NA FORMA DO ART. 173, I, DO CTN. IRRELEVÂNCIA DA DATA DO CONHECIMENTO DO FISCO DO FATO GERADOR.

1. Nos termos em que decidido pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3). 2. Discussão dos autos: No recurso especial discute-se se é juridicamente relevante, para fins da averiguação do transcurso do prazo decadencial tributário, a data em que o Fisco teve conhecimento da ocorrência do fato gerador do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) referente a doação não oportunamente declarada pelo contribuinte ao fisco estadual. 3. Delimitação da controvérsia - Tema 1048: Definir o início da contagem do prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN para a constituição do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) referente a doação não oportunamente declarada pelo contribuinte ao fisco estadual. 4. Nos termos do art. 149, II, do CTN, quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária, surge para o Fisco a necessidade de proceder ao lançamento de ofício, no prazo de cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte à data em que ocorrido o fato gerador do tributo (art. 173, I, do CTN). 5. Em se tratando do imposto sobre a transmissão de bens ou direitos, mediante doação, o fato gerador ocorrerá: (i) no tocante aos bens imóveis, pela efetiva transcrição realizada no registro de imóveis (art. 1.245 do CC/2020); (i) em relação aos bens móveis, ou direitos, a transmissão da titularidade, que caracteriza a doação, se dará por tradição (art. 1.267 do CC/2020), eventualmente objeto de registro administrativo. 6. Para o caso de omissão na declaração do contribuinte, a respeito da ocorrência do fato gerador do imposto incidente sobre a transmissão de bens ou direitos por doação, caberá ao Fisco diligenciar quanto aos fatos tributáveis e exercer a constituição do crédito tributário mediante lançamento de ofício, dentro do prazo decadencial. 7. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado no sentido de que, no caso do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação - ITCDM, a contagem do prazo decadencial tem início no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, observado o fato gerador, em conformidade com os arts. 144 e 173, I, ambos do CTN, sendo irrelevante a data em que o fisco teve conhecimento da ocorrência do fato gerador ( AgInt no REsp 1.690.263/MG, Rel. Ministro Francisco Falcão, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/9/2019, DJe 16/9/2019). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.795.066/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/9/2019, DJe 18/ 9/2019. 8. Tese fixada - Tema 1048: O Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação - ITCDM, referente a doação não oportunamente declarada pelo contribuinte ao fisco estadual, a contagem do prazo decadencial tem início no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, observado o fato gerador, em conformidade com os arts. 144 e 173, I, ambos do CTN.

9. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.[1]

Em consonância com o transcrito Acórdão do STJ, no dia 21/01/2023, foi publicada pela Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais (SEF-MG) a Resolução nº 5.650, que assim dispõe:

RESOLUÇÃO Nº 5.650, DE 20 DE JANEIRO DE 2023

Dispõe sobre a contagem de prazo decadencial na constituição de crédito tributário relativo ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD e sobre o cancelamento do crédito tributário relativo ao imposto, nas hipóteses que especifica.

SECRETÁRIO DE ESTADO DE FAZENDA, no uso das atribuições que lhe confere o § 1º do art. 93 da Constituição Estadual e tendo em vista o disposto no inciso I do art. 7º da Lei Complementar nº 75, de 13 de janeiro de 2004, no inciso I do § 3º do art. 227 da Lei nº 6.763, de 26 de dezembro de 1975, no inciso I do art. 101 do Decreto nº 44.747, de 3 de março de 2008, e no Parecer Normativo nº 16.524/CJ/AGE, publicado em 17 de dezembro de 2022, RESOLVE:

Art. 1º – A constituição do crédito tributário relativo ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD, decorrente de doação não declarada à Secretaria de Estado de Fazenda – SEF, deverá obedecer ao prazo decadencial previsto no inciso I do art. 173 da Lei Federal nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, observada a data de ocorrência do fato gerador.

Parágrafo único – Para efeito de contagem do prazo decadencial a que se refere o caput, é irrelevante a data em que a SEF teve conhecimento da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

Art. 2º – Deverá ser cancelado o crédito tributário constituído em desacordo com o previsto no art. 1º.

Parágrafo único – Constatado que o crédito tributário tenha sido constituído em desacordo com o art. 1º, o Processo Tributário Administrativo – PTA respectivo deverá ser encaminhado à Delegacia Fiscal, independentemente da fase em que encontre.

Art. 3º – O cancelamento previsto no art. 2º:

I – Será formalizado mediante despacho do Delegado Fiscal responsável pelo lançamento;

II – Deverá ser comunicado ao sujeito passivo.

Parágrafo único – O despacho de cancelamento a que se refere o inciso I do caput deverá ser juntado aos autos do PTA, para arquivamento.

Art. 4º – Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

REGES MOISÉS DOS SANTOS

Secretário de Estado de Fazenda, em exercício

(os grifos são nossos)

Resta claro, portanto, tanto da decisão definitiva do STJ quanto dos termos da Resolução nº 5.650, que a contagem do prazo decadencial não se vincula à data em que o Fisco teve ciência da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, mas sim e de fato quando da ocorrência do fato gerador, escoando-se definitivamente o direito do Fisco de lançar o ITCMD no prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. 

Contribuintes, assim, que declararam e recolheram o ITCMD quando superados os prazos de lançamento possuem, assim, o direito inquestionável de repetirem o indébito, ou em bom português, recuperar o valor pago indevidamente.

Ficou alguma dúvida? Conte com a equipe tributária da Andrade Silva Advogados.


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